Durante a faculdade ou mesmo nos primeiros anos da prática jurídica é normal ter receio ao fazer uma petição inicial, sobretudo tendo pouca ou nenhuma familiaridade com essa atividade. Não por outra razão muitas pessoas acabam cedendo ao uso de modelos, o que não é muito indicado quando se quer efetivamente aprender a fazer uma petição inicial. Este breve guia será o seu checklist para a confecção de uma petição inicial com todos os requisitos, formais e materiais.

 

Veja, também, o modelo-guia e um exemplo de petição que disponibilizamos para que neles você se baseie (não vale parar no copia e cola, viu?) e desenvolva sua própria, e confira outras dicas pertinentes à confecção das suas petições. Do começo, portanto.

 

Diferenciando requisitos formais e materiais

Para os propósitos deste texto, propomos uma diferenciação para fins meramente didáticos entre requisitos formais e materiais da petição inicial. Indo direto ao ponto, os requisitos formais são aqueles prescritos em lei, como os dispostos no art. 319 do CPC, enquanto os requisitos materiais têm a ver com a clareza, coerência e persuasão da sua redação e formatação. Comecemos pelos requisitos formais.

 

Requisitos formais da petição inicial 

Os requisitos formais da petição inicial, em suma, são os seguintes:

  • Endereçamento (genérico, já que seu processo ainda será distribuído por sorteio);
  • Nome, prenome, estado civil/união estável, profissão, CPF/CNPJ, e-mail, domicílio e residência do autor;
    • Adicione, depois, que o autor “vem por meio de seu advogado” ou “pelo seu advogado”, já que o seu cliente ou assistido não tem capacidade postulatória;
    • Se o seu autor não tiver capacidade processual, como é o caso das crianças e dos adolescentes, não se esqueça de complementar com a representação legal. O mesmo para pessoas jurídicas, espólio, etc.!
  • O mesmo com relação ao réu, com exceção de que, caso não se conheça alguma informação, como e-mail ou outro contato do réu, desde que não se impeça totalmente a citação, a inicial não será indeferida e você poderá deixar em branco;
  • O nome da ação, que depende dos pedidos realizados;
  • Descrição breve dos fatos e fundamentos (causa de pedir remota e causa de pedir próxima);
  • Embasamento jurídico para os pedidos, devendo constar, desde então, a medida que se requer do poder judiciário, com a correspondente quantificação patrimonial;
    • Se você tem a intenção de requerer tutela provisória (antecipada ou cautelar), não esqueça de fundamentá-la e fazer o pedido expresso!
  • O pleito de procedência dos pedidos (mediato e imediato) e suas especificações (os quais devem figurar de modo determinado, certo, com o respectivo valor, de forma no mínimo estimativa nos casos em que não for possível a sua quantificação exata);
    • Toda inicial deve indicar, ao fim, nos pedidos:
      • A opção pela designação ou supressão da audiência de conciliação (intenção de autocomposição do litígio);
      • O requerimento do benefício da gratuidade da justiça, se o autor for hipossuficiente; 
      • O requerimento de tramitação prioritária, nos casos em que ela se aplica;
      • A produção de prova de modo genérico e também específico, com base no que efetivamente se irá requerer (prova testemunhal para demonstrar determinados fatos X e Y; prova pericial para que seja possível auferir o valor de certos danos, etc.); e
      • A condenação do réu/demandado ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios (sucumbência).
  • O valor da causa;

Ao fim, você não pode esquecer de juntar as provas que demonstram o que você descreveu. 

 

Requisitos materiais

Por mais que existam critérios objetivos para tanto, o preenchimento dos requisitos materiais nem sempre é tão facilmente visualizado. É possível, no entanto, se guiar respondendo às seguintes perguntas, primeiro quanto à formatação (e que já auxilia na clareza):

  • Cada parágrafo exprime um argumento, o qual é desenvolvido a partir de um tópico frasal?
  • Quem ler a minha petição conseguirá separar visualmente os parágrafos?
  • A estrutura da minha petição permite que o leitor identifique e distinga os pedidos constantes na ação?

 

Tenha em mente que uma boa formatação e organização de ideias permite que você se comunique com maior eficiência. Por isso, ao fim do texto deixamos algumas recomendações para que você conheça algumas técnicas de formatação e organização para aplicar nas suas petições.

 

No que concerne à coerência e coesão na redação da sua argumentação, estamos nos referindo, em síntese, à gramática (articulação interna do texto) e à capacidade de demonstrar uma unidade lógica ou encadeamento de ideias. Em primeiro lugar, é importante que você saiba seguir regras básicas da gramática normativa, tais como fazer o uso adequado das pontuações, sobretudo a vírgula; empregar corretamente os pronomes de tratamento e pronomes relativos, muito utilizados no Direito; e escrever de forma clara, poupando o leitor de obscuridades e confusões. A capacidade de demonstrar uma unidade lógica ou encadeamento de ideias vai depender tanto da sua capacidade argumentativa quanto da sua habilidade de se fazer entender.

 

Você pode empregar uma série de estratégias para ser mais persuasivo e deixar sua redação mais convincente. Para tanto, não há rota de fuga: é necessário praticar. Abaixo, segue uma lista de recomendações e um modelo para que você possa se basear para a na confecção da sua inicial. Evite, contudo, copiar e colar. O modelo a seguir, assim como aqueles que qualquer um encontra na Internet, é tão somente um ponto de partida, não podendo ser constitutivo do seu resultado final. Faça, a partir dele, seus próprios modelos.

 

Dicas gerais

 

  • Como se referir às partes?
    • Nas ações de conhecimento em geral (ação de indenização, ação de cobrança, etc.), você pode usar “autor e réu” ou “demandante e demandado”;
    • Nas ações de execução, use “exequente e executado”;
    • Nos embargos, opte por “embargante e embargado”;
    • Nos recursos de apelação, “apelante e apelado”;
    • Nos recursos inominados, “recorrente e recorrido;
    • Na reconvenção, use “reconvinte e reconvindo"; e
    • No mandado de segurança, “impetrante” para o autor e “impetrada” para a autoridade coatora.
  • Como utilizar a jurisprudência?
    • Primeiro, busque sempre a jurisprudência do tribunal do Estado em que a ação será ajuizada;
    • Ao colacionar alguma ementa, busque sempre a mais específica para o seu caso. Caso não encontre nenhuma que seja ideal, explique o diferencial do seu caso que autoriza uma decisão diversa, por exemplo. No entanto, não utilize julgados que possam prejudicar o interesse do seu cliente!
    • Evite ocupar muito espaço da sua petição com ementas. Se necessário, colacione tão somente a parte que lhe favorece em cada uma. Para omitir trechos menos relevantes, use “[...]”; e
    • Use ementas de julgados recentes.
  • Como fazer pesquisa jurisprudencial?
    • Com tempo e prática, você irá se dar conta de certas palavras-chave utilizadas pelos julgadores e, consequentemente, a busca será cada vez mais simples. De início, prefira termos gerais e vá buscando adequar-se ao vocabulário utilizado nos julgados que você encontrar;
    • Para acessar a jurisprudência de qualquer tribunal ou corte superior, você pode acessar o site de cada um ou pesquisar diretamente no Jusbrasil. A base de dados é centralizada e a busca facilitada; e
    • Não deixe de indicar as informações necessárias para que qualquer outra pessoa possa acessar o julgado que você optou por colacionar (isto é, mantenha a referência da ementa!).
  • Como mencionar a legislação no corpo da petição?
    • Um conselho: evite gastar o seu leitor com a sucessiva reprodução de artigos. Na maioria das vezes, a não ser que seja uma lei nova ou muito específica, a verdade é que tanto a julgadora quanto a parte contrária conhecem, às vezes de cor e salteado, a lei que fundamenta o seu pedido. Não é à toa que o brocardo da mihi factum dabo tibi ius é tão utilizado: é que o seu trabalho é trazer ao conhecimento do julgador os fatos que ensejam o ajuizamento da demanda. A lei ele sabe e basta você mencionar o artigo sem reproduzi-lo;
    • Caso seja uma questão de vida ou morte reproduzir o artigo que fundamenta seu pedido, e sobretudo se ele for muito longo, prefira transformá-lo em uma citação (adicione, portanto, recuo, e diminua a fonte);
    • Basta mencionar de onde você tirou (Código de Processo Civil, Código Civil, Constituição Federal, Lei nº 123.45/2000, etc.). Não é necessário fornecer toda referência em ABNT. Sua petição não é uma monografia!
  • Como mencionar a doutrina?
    • Primeiro, considere se ela é estritamente necessária. O primeiro filtro do juízo de necessidade é o seu próprio. Por isso, considere se a questão é controvertida o suficiente para justificar um argumento de autoridade. Se é um entendimento convencional, e inclusive amplamente aceito, evite.
    • Caso tenha de fazer uso da doutrina, use citações simples e reproduza grandes trechos apenas quando for estritamente necessário. Dê recuo sempre que a citação superar quatro linhas e diminua a fonte. Mencione os elementos de referência a fim de que possa ser consultada pelo seu leitor (nome do autor, obra/postagem, edição, data de publicação, página, se há link para consulta, etc.); e
    • Prefira doutrinadores(as) reconhecidos. Nunca é um erro recorrer aos clássicos, mas cuide a data de publicação das obras para que você não passe por desatualizado.
  • O que sugerimos que você não faça na inicial nem em qualquer outro momento do processo:
    • Não peça a procedência da ação. O correto é pedir a procedência dos pedidos;
    • Não use cores chamativas para dar destaque às palavras na sua petição! Use apenas o negrito e itálico, e somente quando necessário;
    • Tenha cuidado com o uso de marcas d’água atrás do texto, pois elas tendem a tornar a petição visualmente pesada, podendo, inclusive, prejudicar a leitura. Se possível, evite usá-las; e
    • Não seja desrespeitoso com os demais envolvidos no processo, sejam eles os colegas ou as partes.